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segunda-feira, 11 de abril de 2011

Análise de especialistas: Matemática

Por Nílson José Machado, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP).

Avaliação crítica
(baseada na leitura da prova amarela)

A prova foi muito simples. As questões mantiveram-se fiéis ao princípio básico do Enem, exigindo mais as competências expressas nos eixos cognitivos (capacidades de expressão, compreensão, contextualização, argumentação, proposição) do que conhecimentos disciplinares demasiadamente específicos. Abrangeu as sete competências de área apresentadas na matriz de referência correspondente, explorando-as por meio de conteúdos disciplinares como geometria plana e espacial, aritmética, álgebra, trigonometria, gráficos, equações e problemas, combinatória, probabilidade e estatística. Da lista de “Objetos do conhecimento” da área de Matemática associados à matriz, os conhecimentos algébricos, sobretudo relativos a funções, e especialmente as exponenciais e os logaritmos, e os algébricos/geométricos, como a geometria analítica, praticamente não estiveram presentes.

As questões fáceis predominaram: cerca de 60% das questões da prova podem ser assim classificadas. Entre estas, algumas eram muito fáceis, mesmo para alunos do Ensino Fundamental. Alguns exemplos de tais excessos de simplificação, que podem comprometer o poder de discernimento da prova, são as questões de número 136, 138, 143, 146, 148, 177 e 180.

Questões difíceis quase não ocorreram: menos de 10%, sendo que, às vezes, a suposta dificuldade deveu-se a certa nebulosidade no enunciado. Um exemplo é a questão 156. A pergunta diz respeito à “menor probabilidade de engarrafamento possível” (sic), ao se deslocar da cidade A para a cidade B, usando duas vias sucessivas. Quando se supõe que “ocorrência de engarrafamento” refere-se às duas vias simultaneamente, a questão é de dificuldade média (resposta B); quando se pensa que o engarrafamento em apenas uma delas deverá ser considerado, os cálculos aumentam muito e a questão torna-se mais difícil (resposta D). Duas respostas são, então, possíveis, e não sabemos como tal fato será administrado pelos examinadores.

Alguns formatos de questão, muito desgastados, foram explorados em excesso, caracterizando uma evidente carência de criatividade. Os gráficos de colunas são um exemplo dessa ocorrência: questões como a 140, a 141 e a 145 representam uma reiteração típica de falta de imaginação. Em outras, a pobreza da formulação é ainda mais radical, como na 148, na 167 e na 180.

Não fomos poupados da ocorrência de enunciados imprecisos do ponto de vista do conteúdo. Em algumas questões, certas informações são assumidas tacitamente, e, por mais razoáveis que pareçam, deveriam ser explicitadas. Tal é o caso das questões 140 (o desmatamento médio cresceu 10,5%), 144 (a figura é que complementa a informação), 151 (encher “pela metade”), 154 (supõe que o crescimento de uma empresa é avaliado pela porcentagem do lucro anual), 161 (o valor de S é ..., e não “é periodicamente...”), 176 (supõe que a frase “dentro da Terra cabem 7 Martes” significa que “o volume da Terra é sete vezes maior do que o de Marte”) etc.

Um pouco mais sérias são as ocorrências de questões tecnicamente mal formuladas do ponto de vista de sua arquitetura. É o caso de enunciados cujo caput somente se completa com as informações presentes em cada uma das alternativas, o que transforma em cinco questões o que deveria ser uma questão, comprometendo o tempo dos alunos. Alguns exemplos são as questões 150, 151, 162 e 171.

De modo geral, com a formulação do Novo Enem, a expectativa era a de que uma exploração mais densa dos conteúdos disciplinares viesse a ocorrer. Os avanços nesse sentido, no entanto, ainda foram muito tímidos. O grande número de questões fáceis e/ou inexpressivas dificultou tal tarefa.

Na prova de Matemática, os enunciados não foram demasiadamente longos, como em outras ocasiões, ou em outras provas desse mesmo Exame. Os examinadores procuraram sempre apresentar algum contexto para os conteúdos, mesmo os muito simples, mas tiveram o mérito de não confundir “contexto” com “muito texto”, o que tem sido muito frequente em pretensas e caricatas contextualizações.

É importante registrar, porém, que no que se refere à interdisciplinaridade, apenas uma das 45 questões poderia receber apropriadamente tal rótulo: a de número 165, que exigia algum conhecimento de Física. Nas demais, os examinadores se contentaram com a apresentação de algum contexto para os conteúdos das questões, mas as perguntas envolviam conhecimentos estritamente disciplinares.

Para concluir, lamentamos que, mais uma vez, problemas da logística do exame tenham mais destaques na mídia do que as questões técnicas e conceituais referentes à sua natureza e à sua qualidade. As mudanças advindas do Novo Enem, no sentido de uma aproximação entre as disciplinas e as competências, parecem essencialmente corretas, mas a extensão das provas e a própria arquitetura do exame mereceriam uma análise mais aprofundada. E a consistência teórica da transformação do Enem em processo seletivo para as universidades, bem como a pertinência de sua utilização na constituição de rankings deveriam ser seriamente debatidas.

Número de questões no Enem 2010

Conhecimentos numéricos

Aritmética e manipulação dos números 8
Álgebra e manipulação de termos 1
Sequências e progressões 2

Conhecimentos geométricos

Geometria plana 3
Geometria espacial 10

Estatística e probabilidade

Representação de análise de dados 7
Medidas de tendência central 2
Medidas de variabilidade 1
Probabilidade 3

Álgebra

Álgebra relacionada ao uso da incógnita 6
Álgebra relacionada ao uso da variável 2
Álgebra relacionada à trigonometria 2

COnhecimentos Algébricos-geométricos

Plano cartesiano 2

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